Translate

domingo, 5 de agosto de 2018

Paulinho


Resultado de imagem para father's day

É um dia especial para Paulinho. Ele acorda cedo e vai à padaria. Compra 5 pães, duas bisnagas, 250 gramas de muçarela, 250 gramas de presunto, requeijão, um bolo de chocolate, dois sonhos, duas broas, dois litros de leite e dois sucos de caixinha.

Na volta para casa, com duas sacolas na mão direita e uma na esquerda, se distrai com uma pipa que está caindo e esbarra na sua vizinha dona Maria, que com seu corpão acaba aliviando o choque. Paulinho solta a sacola onde estão os sonhos mais as caixas de leite que se esparramam pelo asfalto.

- Oh, Paulinho. Presta atenção. Está com a cabeça na lua?
- Me desculpe dona Maria. Eu não vi a senhora.
- Claro que não. Estava olhando para o céu. Estava literalmente com a cabeça nas nuvens.
- Desculpa mais uma vez dona Maria.
- Tudo bem. Deixe-me ajuda-lo a pegar as coisas.

Dona Maria tenta se abaixar para pegar uma das caixas de leite quando sente uma dor insuportável nas costas. “Não é possível”, ela pensa. “Acabei de chegar do hospital e pelo jeito terei que voltar.”

- A senhora tá bem?
- To sim. É só essas minhas costas que um dia ainda vai me matar.
- Qué que chame alguém?
- Sim. Quando passar perto de casa, peça para o Beto vir me buscar de carro. Diga que dei mal jeito nas costas. E peça para ele trazer a carteirinha do convênio. Muito provavelmente teremos que ir ao hospital.
- Sim, senhora.
- Hey, onde você vai?
- Chamar o Beto.
- Sim, mas e essas coisas no chão?
- Verdade.

Paulinho recolhe os dois sonhos e as caixas de leite do meio do asfalto, se despede de dona Maria com um abraço e volta para casa. Por um momento ele ficou distraído com a pipa e depois com dona Maria, mas é hora de voltar a realidade do dia de hoje.

Quando chega em casa estão todos ainda dormindo. Silêncio total. Com um largo sorriso ele tira as coisas da sacola e as coloca em cima da mesa. Faz uma nova recontagem e confirma que está tudo lá. Não esqueceu nada na padaria. Ou no asfalto. Olha para a pia e o sorriso some. Está uma verdadeira bagunça e ele não pode deixar daquele jeito. Pega o avental, o banquinho que está na varanda de casa e começa a lavar a louça.

Enquanto lava a louça ele olha, através da janela da cozinha que fica acima da pia, a pipa que tinha visto quando se esbarrou na barriga macia da dona Maria. Fica admirado com os movimentos da pipa. Aliás, ela não se movimenta. Ela dança. Uma dança hipnotizadora. Enquanto ele se imagina ao lado da pipa, os dois dançando graciosamente, ele deixa um copo escapar e cair no chão. De olhos fechados e em silêncio, fica na expectativa de alguém acordar com o barulho. Não escuta nada, a não ser o som ensurdecedor e irritante do ronco do seu tio. “Ótimo. Todos continuam dormindo”, pensa ele.

Acaba de lavar a louça e começa a etapa dois: varrer a casa. Ele não quer preparar o café da manhã com o chão da cozinha daquele jeito. E não pode simplesmente limpar uma parte da casa e deixar o resto sujo. Pega a vassoura, que dá dois dele, e começa a varrer. Olha para o relógio e já são quase 9 horas da manhã. Ele então começa a varrer mais depressa, pois logo o pessoal começará a acordar. Termina a operação vassoura em menos de 10 minutos. Vai então até a varanda pegar a pá, quando se lembra que ele e o seu irmão a quebraram no dia anterior enquanto brincavam de taco.

Ele olha para o monte de sujeira que está a sua frente. O que fará? Vem então a sua mente um dos desenhos do Tom e Jerry (o seu favorito). Se lembra que o Tom estava na mesma situação que ele. E o que Tom fez? Varreu a sujeira para debaixo do tapete. E é isso que Paulinho faz. O tapete fica com um volume que se parece com uma barriga. Paulinho torce para que ninguém perceba, ou melhor, que ninguém tropece na sujeira.

É hora de preparar a mesa. Coloca as sacolas na pia que agora está limpa, pega a toalha mais nova que encontra e forra a mesa. Depois abre o armário e pega os pratos. Ele tenta pegar 4 pratos simultaneamente, o que é pesado para ele, e com isso deixa cair um deles. O barulho dessa vez é mais alto do que quando deixou o copo cair. De novo ele fecha o olho e aguarda alguém aparecer na cozinha. Nada. Somente o som irritante do ronco do seu tio. Aliviado, continua a arrumar a mesa.

Depois de colocar tudo em ordem, é hora de tomar banho. Pega a toalha, sua cueca preferida (do Tom e Jerry), sua camisa e bermuda (também do Tom e Jerry), o sabonete (não, não é do Tom e Jerry), o xampu (esse sim é do Tom e Jerry) e se dirige ao banheiro. Precisa ficar bonito e cheiroso para esse dia tão especial. Esfrega os braços, as pernas, o bumbum e o pipi da forma como seu irmão ensinou. Passa o xampu no cabelo curto de fios finos. Começa a cantarolar Lembre de Mim, música tema do filme Viva – A vida é uma festa. Ele assistiu esse filme mais de 10 vezes e sempre se encanta com as músicas e as cores. Ah, e com o cachorro Dante que é uma figura a parte.

10 horas da manhã. Louça lavada, casa varrida, mesa posta, banho tomado. Vai até o quarto chamar o seu tio. Ele quer que todos participem desse momento. Com muito cuidado abre a porta e se aproxima da cama. Seu tio continua roncando. Paulinho carinhosamente passa a mão na sua cabeça e chama pelo seu nome. Nada. Seu tio continua a roncar. Ele tenta novamente, mas sem sucesso. Resolve então dar um soco no braço do seu tio que abre os olhos assustados e fixa o olhar para o teto. Paulinho está com medo. Parece estar num filme de terror. Agora o seu tio olha para ele, mas não fala nada. Depois de 30 segundos aterrorizantes, seu tio volta a fechar os olhos e começa a roncar novamente. Dessa vez mais alto. Paulinho aborta a missão. Sai correndo do quarto. Ele vai guardar um pedaço de bolo para o seu tio.

Se dirige até o quarto do seu irmão. Vagarosamente abre a porta. Não quer assusta-lo. Da ultima vez levou uma chinela na testa. Se aproxima da cama e puxa a coberta. Seu irmão está com a mesma roupa que saiu de casa a noite. Deve ter ficado fora até tarde da noite, o que não seria a primeira vez. Paulinho tenta acorda-lo, mas é inútil. Ele não está dormindo. Está apagado. Paulinho desiste. Assim como para o seu tio, irá guardar um pedaço de bolo para o seu irmão também. E broa. Ele adora broa.

Bem, é hora de acordar a pessoa mais importante. Ele vai até o quarto e a pessoa não está lá. Estranho. Deve estar no banheiro. Ele vai até o banheiro e também nada. Deve estar na sala. Se dirige a sala e nada. Paulinho começa a se preocupar. Será que tinha saído? Mas Paulinho não tinha ouvido o barulho do carro. “Deve ter saído enquanto eu estava na padaria”, pensa Paulinho. Era uma teoria plausível.

Ele está triste. Acordou mais cedo do que o habitual para ter tudo preparado para essa pessoa que ele tanto admira. Fica um tempo na sala, pensativo, cabisbaixo. Queria que hoje fosse um dia para ser lembrado, para ficar marcado. Levanta-se e vai em direção a cozinha. Está com fome, mas não vai comer, pois a pessoa que deveria estar lá não está. Paulinho está sozinho.

Ao chegar na cozinha, a tristeza é deixada de lado e um grande sorriso toma o seu lugar. Ele não acredita nos seus olhos. A pessoa está ali, sentada à mesa. Paulinho sai correndo e dá um grande e demorado abraçado nela, sua mãe.

- Mãããããããããe!!!!! Pensei que a senhora tinha saído. Fui no seu quarto e a senhora não estava lá.

Os olhos de dona Izilda se enchem de lágrimas. Ela olha para Paulinho com um olhar afetivo, amoroso, carinhoso. Puxa Paulinho mais uma vez para um outro abraço, agora seguido de vários beijos. Ela então solta Paulinho que imediatamente pergunta.

- Mãe, por que a senhora está chorando? Não gostou?
- Adorei. Foi você que arrumou a mesa?
- Sim.
- Sozinho?
- Sim.
- O seu tio não ajudou?
- Não. O tio só dorme. Dorme e ronca. E como ronca alto, né?

Ela dá risada. Ela conhece bem o ronco do seu irmão.

- E como ronca alto. Quando éramos adolescentes eu costumava dar uns tapas nele enquanto dormia para ver se parava de roncar.
- Funcionava?
- Não. Mas era gostoso dar uns tapas nele. Hahaha
- Posso dar uns tapas nele também?
- Claro... que não. Hahaha... ele é o seu tio. Não faça isso,
- Tá bom, mãe.

Ela então colocar Paulinho sentado à mesa, mas ele se esquiva.

- Você não vai sentar e tomar café comigo?
- Sim, mãe. Mas primeiro eu vou servir a senhora.

Paulinho então pergunta o que ela quer comer e serve sua mãe. Depois se senta à mesa, ao lado dela, e os dois então começam a tomar o café da manhã.

Izilda olha para pia e vê que está arrumada. Ela não se lembra de ter lavado louça ontem à noite.

- Você lavou a louça também?

Com um pedaço de pão na boca Paulinho responde que sim e acrescenta.

- E varri a casa também.

Dona Izilda olha para o tapete e sorri.

- É, eu percebi.

Paulinho espera que ela não tenha notado a sujeira debaixo do tapete. Enquanto comem, o seu tio aparece na cozinha. E logo depois o seu irmão se junta a eles e todos felizes tomam café e conversam.

Paulinho então pede licença para sair da mesa e vai até o seu quarto. Quando volta tem um papel em suas mãos escrito PARABÉNS!!! Ele chega perto de sua mãe e entrega o papel junto com uma caixinha. Sobe numa cadeira e então começa a falar.

Querida mamãe, sei que não tem sido fácil pra senhora. Desde o dia que o papai nos deixou, você tem trabalhado em dobro, tanto em casa quanto no serviço. E mesmo cansada a senhora sempre está com um sorriso do rosto. Nessa semana a professora falou que deveríamos homenagear nossos pais. Disse a ela que não tenho mais pai. Ela ficou triste, mas disse para ela não se preocupar porque agora eu tenho uma mãe-pai.

Pensei em comprar um presente pra senhora, pois você merece, mas como não trabalho ainda pois sou pequeno, pedi dinheiro para o meu tio e o meu irmão. Eles disseram que só dariam se eu limpasse o quarto deles. E eu fiz isso. A semana toda. Ontem eles me pagaram. O tio não queria pagar, mas eu briguei com ele e ele pagou. Peguei o dinheiro hoje de manhã e fui na padaria. Preparei esse café pra senhora porque todo dia a senhora prepara o café pra nós. Comprei o sonho e a broa, que assim como o meu irmão, a senhora tanto gosta.

Mãe, as vezes vejo a senhora chorando no seu quarto pela ausência do pai. Sei que a senhora queria que ele estivesse aqui. Eu também queria. Mas infelizmente não está e isso te entristece muito. Mas a senhora é tão fantástica que ao invés de ficar desanimada a senhora arranja forças para cuidar da casa, cuidar de nós e ainda trabalhar fora.

Mãe, saiba que EU TE AMO DEMAIS. A senhora pra mim é a minha mãe e também o meu pai. A senhora...

Paulinho não tem tempo de continuar falando aquilo que passou a semana inteira ensaiando. Sua mãe não deixa. Ela, chorando como criança, está em cima dele, beijando-o, abraçando-o, sufocando-o com amor e carinho.

Do lado deles, o tio de Paulinho e seu irmão estão de boca aberta. Não acreditam no que acabam de ouvir.

- Wow. Como que o Paulinho conseguiu falar tudo isso? Será que ele decorou ou falou tudo de improviso? Wow. Foi lindo demais. Que pena que não gravei.

O tio de Paulinho olha para o lado, esperando a resposta. O irmão de Paulinho está estático, com olhos lacrimejados. O tio insiste.

- E ae? Como será que o Paulinho conseguiu decorar tudo isso?
- Como ele fez isso eu não sei tio, mas que o meu irmão é zica, ah isso ele é.

O irmão de Paulinho está fazendo algo que dificilmente faz. Está chorando. Seu tio percebe e então diz.

- Que tal nos unirmos a eles?

Os dois então correm em direção da dona Izilda e Paulinho e juntos formam um grande e caloroso abraço.



***********************************************************************


Essa história pode parecer um pouco estranha, uma vez que nessa semana celebramos o Dia dos Pais. Porém, ela não está fora do que acontece hoje em dia em muitos lares. Assim sendo...

Essa é uma singela homenagem as mulheres que hoje são não somente mães, mas também pais. Algumas porque a morte levou os seus maridos. Outras porque se separaram. Outras porque nem chegaram a se casar.

Não importa qual seja o caso. Todas precisam se desdobrar para cuidar de casa, dos filhos, do trabalho e ainda arranjar tempo para se cuidar. O que muitas vezes não acontece.

A essas mulheres os meus...


PARABÉNS MAMÃE-PAPAI!!!





10 comentários:

  1. Nossa...adorei o seu texto,acho que me encaixo bem nessa situação tambem.Mas parabens aos pais tambem que assim como você mesmo longe os mantem perto.Feliz Dia dos Pais pra vc...e que seja maravilhoso esse dia, mais que especial!Bjos Ed.

    ResponderExcluir
  2. LINDO TEXTO,LINDA MENSAGEM
    !!E OBRIGADA POR FAZER EU ME SENTIR ESPECIAL... PARABÉNS AOS PAPAIS E MAE-PAIS😍👏👏

    ResponderExcluir
  3. Ah! Conseguiu me arrancar lágrimas!!!

    ResponderExcluir
  4. Adorei, lindo texto para reflexão!!!

    ResponderExcluir
  5. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  6. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir