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segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Dia dos professores 2


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- Mas por que você virou professora mesmo?

Essa pergunta persegue Larissa desde o dia que ela se formou, o que aconteceu no final do ano passado. Ela se recorda como se fosse ontem.

Seus pais estão orgulhosos com filha, pois veem nela um sonho se realizando. Eles mesmo não tiveram essa oportunidade. Os dois são analfabetos. Não sabem ler e mal escrevem o próprio nome. Seu José desde os 8 anos ajudava o pai na carvoaria da cidade e dona Maria ajudava a mãe em casa a cuidar dos irmãos e irmãs.

Larissa olha para os professores e amigos e abre um sorriso. Ela então se vira para os pais e o sorriso se transforma em lágrimas, mas não de tristeza e sim de alegria e orgulho. Ela sabe o quanto eles tinham sacrificado. Eles, mesmo sendo analfabetos, incentivavam a filha a estudar, a ler, a se preparar para a vida. Seu José costumava dizer que ele podia não saber ler, mas não sua filha. Ela seria doutora, ou professora, ou diretora, bem, alguma coisa oura que iria trazer orgulho para a família.

Larissa então volta o pensamento para o primeiro dia de aula. Não foi o que ela pode classificar como o melhor momento da vida dela. A começar pela escola em si. Um prédio velho, com buracos no telhado, água vazando no banheiro das meninas, ninhos de ratos em algumas salas de aula. Um prédio judiado pelo tempo e esquecido pela administração regional da cidade.

Essa situação tira um pouco o brilho do primeiro dia, porém ela está mesmo é preocupada com os alunos. De como será recebida. “Será que iriam gostar dela? E se ela começasse a gaguejar de nervoso? Os alunos iriam rir dela? O diretor iria manda-la embora? Seria muito triste ser demitida no primeiro dia de aula.” Esses e muitos outros pensamentos povoam sua cabecinha antes de colocar os pés pela primeira vez numa sala de aula.

Sua mente então a leva para a primeira reunião de professores. Ela também ansiava por esse dia. Queria ouvir dos professores mais velhos, com mais experiência. Queria aprender com eles, afinal eles estavam na estrada do ensino a mais tempo que ela.

- Nossa!!!! Peguei os pestes da 5 série E. Como eu odeio essas crianças.
- Crianças?!?!? Tudo marmanjo. Tem criança ali não.
- E você, Margarete?
- Ah, os meus também não são anjos. Ninguém prepara a lição de casa. Aff!

Larissa fica perplexa com o que ouve. A maioria dos professores reclama dos alunos. E nenhum apresenta uma solução plausível para tais problemas. Usando a estratégia que pensou no dia anterior, Larissa apenas ouve, não dando pitacos nas opiniões dos outros professores. Até que...

- E a professora nova? O que está achando de dar aula? Já quer desistir? Olha que dá tempo, viu? Vai atrás de outra profissão.

Todos caem na gargalhada. Todos menos a diretora.

- Margarete, você realmente acha isso engraçado?
- Não, diretora. Na verdade, acho isso triste.
- Você quer saber o que eu acho?
- Sim, por favor. Nos ilumine com sua sabedoria.
- Acho que você precisa de uma reciclagem. Assim como esse prédio, você também parou no tempo.

A tensão no ar é palpável. Olhares são trocados. Conhecendo Margarete, ela não ficará sem dar uma resposta à altura. A diretora então se antecipa e termina a reunião. Dispensa todos os professores, exceto Larissa. Ela quer ter uma conversa particular com sua professora mais nova.

- Me perdoe, Larissa. Você não precisava ter ouvido isso.
- Tudo bem.
- Margarete é uma das nossas professoras mais antigas e uma das melhores também. Gosto dela, mas realmente acredito que ela precise se reciclar. Aliás, acredito que todo o nosso sistema de ensino precisa mudar. Precisa de um chacoalhão.
- Eu concordo.
- Concorda? Que bom. Fale-me sobre os seus alunos, suas aulas e sobre o que você acha do ensino hoje.

Elas ficam na sala dos professores por volta de 1 hora e meia e Larissa pode conhecer um pouco dos pensamentos da diretora e dividir com ela o que pensa sobre escola, alunos, professores, metodologia, etc. A conversa é muito agradável até o momento que a diretora pergunta:

- Mas por que você virou professora mesmo?

Larissa não sabe responder. Bem, pelo menos não de forma clara. Fala, fala, fala e não diz nada. Divaga sobre o ensino no Brasil, a participação do professor dentro e fora da sala de aula, mas não é clara. A diretora, experiente como ela só, busca acalma-la.

- Tudo bem, Larissa. Eu acho que entendi.
- Desculpa. Não fui muito clara.
- Não tem problema. Com o tempo você terá a resposta certa.

E o tempo passou, as férias de julho chegaram, as férias de julho passaram e Larissa ainda não tinha uma resposta concreta para a pergunta da diretora, o que lhe deixava intrigada, pois ela adora dar aula e cresceu com o pensamento de ser professora.

Ela não consegue pensar em mais nada a não ser na pergunta. Acorda pensando nela e vai dormir pensando nela. Nenhuma resposta a convence. Ela está tão entretida na busca por uma resposta que esquece que dia é hoje.

Chega na escola e encontra sua sala vazia. Não entende nada. Vai então até a sala dos professores. Ninguém lá também. A diretora então a encontra no corredor e a leva até o pátio da escola.

Ao chegar lá, surpresa. Todos os alunos da escola estão sentados no pátio. Os professores estão em pé, atrás dos alunos. Larissa, ainda sem entender nada, pega o calendário para checar que dia é hoje. Depois de ver a data, as coisas começam a fazer sentido.

A diretora então toma o centro do pátio.

- Bom dia, professoras e professores. Bom dia, alunas e alunos. Bom dia, pais dos professores.

Larissa toma um susto. Os seus pais estão ali fazendo o que?

- Hoje é um dia especial. Hoje é o dia deles, dos nossos queridos professores.

Todos que estão no pátio começam a aplaudir entusiasmadamente. Os professores então levantam o braço e acenam. Todos com ar de surpresa.

- Bem, como se pode ver nos rostos dos professores, eles não sabiam. Eu quis fazer algo novo esse ano, por isso disse para eles que não iríamos comemorar o dia dos professores. Muitos ficaram tristes. Alguns até me xingaram, me chamaram de desalmada. Disseram que eu não reconheço o trabalho deles.

Margarete olha para baixo. Ela estava agora com vergonha das coisas que disse para a diretora.

- Mas tudo bem. Eu os perdoo. Sei que ficaram tristes, pois é uma data especial pra eles. Bem, eles não sabiam, mas os alunos sim. Falei com cada um deles, assim como falei com os pais dos professores.

Larissa olha para os seus pais que estão sorrindo para ela.

- Pedi sigilo absoluto. Não queria que vocês professores soubessem e, pela cara de surpresa de vocês, os alunos e pais conseguiram manter segredo. Parabéns a todos. Sei que não foi fácil.

Mais uma salva de palmas e gritos de Uhuuuuuuu!!!

- Assim como pedi sigilo, pedi para os alunos escreverem o que pensam dos professores. Disse para que fossem sinceros, que abrissem o coração.

Tensão no ar. Os professores ficam apreensivos com o que o Joãozinho irá falar sobre eles.

- Bem, em primeiro lugar quero entregar esses presentes para todos os professores.

A diretora então chama professor por professor e entrega uma caixa que contém um livro, uma caixa de bombom e um vinho. Ela pensou nesses presentes depois de conversar com os professores, conhecê-los melhor e perceber do que eles gostam. Chegou no livro, bombom e vinho.

Os professores gostam do presente. O que eles nunca irão saber é que o dinheiro dos presentes saiu do bolso da diretora, pois a administração regional não separou dinheiro para comemoração do dia dos professores.

- Como diria Eddie, nosso professor de inglês, Well, it’s time! Hora de ouvirmos nossos amados alunos. E para começar os trabalhos... chamo a frente a aluna Cícera.

Cícera se levanta, vai até o centro do pátio e começa a falar...

“Querida professora Margarete. A senhora é uma ótima professora, mesmo nós não sendo ótimos alunos. A senhora pede toda aula para fazermos lição de casa e toda aula a gente esquece. A senhora fica com muita raiva. Sabe como sei disso? As suas orelhas ficam vermelhas. Fica com raiva não, professora. Isso é ruim para a sua saúde. Oh, te amo viu. Mesmo a senhora sendo brava as vezes. Sei que a senhora só quer o nosso bem. E prometo, na frente de todo mundo aqui, fazer todas as lições de casa.”

Aplausos efusivos. Cícera leva o bilhete e entrega na mão de Margarete, que com lágrimas nos olhos, dá um abraço carinhoso em Cícera que volta para o seu lugar e dá espaço agora para Sonia.

“Dear, teacher Eddie...

Eddie, professor de inglês da Sonia, abre um sorriso de orelha a orelha. Fica imaginando que sua aluna irá ler um texto todo em inglês. Ah, que orgulho ele está sentindo agora. Sonia então faz uma pausa, olha para Eddie e continua...

“eu odeio ingrêis, eu odeio essa língua maldita. Não consigo entender nada. I am... You are... He are… She are… aaaaaaaaahhhhh odeio odeio odeio... Odeio você também teacher. Não gosto de você, nem das suas aulas, nem dessa língua... você fica lá falando e eu não entendo nadaaaaaa... Oh, e não sou apenas eu, tá? Um monte de gente não gosta de você e nem dessa língua. Tenha um péssimo dia dos professores!!!”

Silêncio no pátio. Sonia deixa o centro do pátio e, batendo o pé, volta para o seu lugar. Todos, simplesmente todos, têm os olhos voltados para Eddie que não sabe onde enfiar a cara. Larissa, que está próximo dele, dá um abraço nele, tentando confortá-lo. Ela então, bem baixinho, diz no ouvido dele, “Eu gosto das suas aulas e adoro inglês.”

Eddie abre um pequeno sorriso, pega o seu presente e vai para sua sala. Não tem mais clima para ficar ali.

- Bem, momento awkard, ladies and gentlemen. Mas vamos continuar. O show não pode parar. Como diria o Eddie, the show must go on. Bem, talvez não seja um bom momento falar sobre o Eddie agora. Mas então, continuando, nosso próximo aluno é o Anderson.

Anderson, um menino pequenininho, tímido de tudo, se levanta e vai em direção ao centro do pátio. Começa a falar, mas sua voz é tão baixa que ninguém consegue ouvir. Providenciam então um microfone velho que estava na sala dos professores e entregam pra ele. Agora sim é possível ouvi-lo.

“Querida professora Larissa. Sempre fui tímido e por conta disso não tenho muitos amigos. Na verdade, acho que não tenho amigo algum. Os outros alunos não gostam de falar comigo. Gostam sim de fazer piadas comigo, com o meu tamanho. Sempre me senti excluído. Os professores nunca me deram atenção. Bem, isso até a senhora chegar aqui na nossa escola. Não sei se a senhora se lembra, mas no primeiro dia de aula a senhora se sentou ao meu lado quando eu disse que não tinha entendido a lição. Eu nunca vou me esquecer da atenção que a senhora me deu. Aquele momento foi muito mais que especial. E percebi que a sua atitude não é exclusiva minha. A senhora é assim com todos os alunos. A senhora é carinhosa, bondosa, prestativa e explica muito bem. Por isso digo: MUITO OBRIGADO, professora Larissa!!! Feliz dia dos professores!!!”

Anderson começa a andar em direção da professora quando é tomado por um abraço. É Larissa. Ela sai correndo do seu lugar para abraça-lo. Aquelas palavras tocam e muito o coração dela. Ela chora como criança. E lá no fundo, seus pais também choram. Aliás, difícil é achar alguém que não esteja emocionado com aquele momento.

A diretora então chama a atenção para si novamente e continua com as homenagens. Dessa vez ela chama o Joãozinho. Tensão e apreensão no ar. Enquanto ele se encaminha para o centro do pátio, as pessoas observam algo diferente nele. Ele está bem vestido e com um penteado im-pe-cá-vel.

Ele então, assim como Anderson, pega o microfone e começa a falar.

“Querida professora Jasmim, a senhora é literalmente uma flor. Pensei muito antes de escrever essa pequena carta de amor. Sim, eu disse AMOR... Professora, a senhora é minha musa inspiradora. Você é quem me faz levantar todos os dias e vir para essa escola. Gosto de estudar? Claro que não. O que me move até aqui são os seus cabelos ruivos e cacheados. O seu perfume toma conta do ar e das minhas pequenas narinas. A sua pele... aaahhh a sua pele. Ela é macia como pêssego. Como sei disso? Todos os dias você faz parte dos meus sonhos e neles eu acaricio a sua pele, beijo seus lábios carnosos, desço minha boca pela sua barriga até chegar na....

- EEEEEPPPPPPAAAAA!!!! OK OK OK.

A diretora dá um pulo e toma o microfone de Joãozinho.

- Muito obrigado Joãozinho. Acho que todos entendemos. Não é professora Jasmim?

A professora Jasmim não sabe onde enfiar sua cara. Os outros professores estão morrendo de rir. Os colegas de Joãozinho o parabenizam pela coragem.

- Ok, pessoal. Depois desse momento caliente vamos continuar as homenagens.

E assim os alunos continuam emocionando os seus professores com expressão de carinho através das mensagens. Ao final das homenagens, todos são convidados a comer e beber.

Enquanto eles comem, muitos aproveitam para conversar, colocar o papo em dia, comentar sobre o que foi lido. A diretora então vê Larissa conversando com os seus pais.

- Com licença.
- Olá, diretora. Que belo evento. Parabéns.
- Não foi nada. Vocês professores merecem.
- E essa comida aqui? Que delícia!
- Agradeça sua mãe. Ela que teve a iniciativa de falar com os outros pais e preparar essa farta mesa com comes e bebes simplesmente deliciosos.
- Ah, minha mãe é assim mesmo.

Larissa dá um abraço apertado em sua mãe. Depois dá um abraço apertado no seu pai. Ela então vira para a diretora e diz:

- Diretora, já tenho a resposta.
- Resposta?
- Sim, para a pergunta que você me fez na reunião dos professores.
- Qual pergunta? Fiz tantas.
- Você me perguntou: Mas por que você quer ser professora mesmo?
- Ah, verdade. Lembrei agora. Tá, qual é a resposta.

Larissa beija os seus pais, põe a mão na bolsa e puxa as cartinhas que recebeu dos seus alunos.

Ela então aponta para os pais e diz:

- Por causa deles.

Depois aponta para as cartinhas e diz:

- E por causa deles.

A diretora abre um sorriso e responde:

- Essa é a melhor resposta que você pode dar. Sempre que lhe perguntarem o porquê de você ter escolhido essa profissão, diga: POR CAUSA DELES.
- Obrigado diretora. Você é uma ótima pessoa e excelente profissional.
- Sou nada.
- É sim. Por exemplo, eu sei que a senhora comprou os nossos presentes com o seu dinheiro.
- Quem te disse?
- Um passarinho.
- Ah, esse passarinho fala demais.
- Obrigado, viu. Amei os presentes. Aliás, acho que vou abrir a caixa de bombons agora. Que tal?
- Ótima ideia. O de amendoim é meu.

Larissa então abre a caixa e eles ficam ali, degustando os bombons e se divertindo com as histórias do pai de Larissa.


                                              * * * * * * * * * *


Parabéns Larissas, Margaretes, Jasmins, diretoras... Continuem sendo pessoas especiais que fazem diferença na vida de milhões de brasileiros.

Todos nós temos histórias emocionantes para contar e isso é POR CAUSA DE VOCÊS!!!!


PARABÉNS PROFESSORES


sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Brasis

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- Deve ser muito dolorido, não?
- E como.
- O que aconteceu?
- Morreram de desgosto.
- Mas eles eram tão unidos. Sempre felizes.
- Há quanto tempo a senhora não aparece em São Paulo, tia?
- Já vai para uns 24 anos.
- Então a senhora não sabe da missa a metade.
- Então fill me in.
- É uma longa história.
- Bem, não iremos a lugar algum nas próximas horas.
- Ok! Então, senta que lá vem história.

O ano é 2000. Todos estão em polvorosa. É muita alegria. Pela primeira vez na história da família eles terão o nascimento de não um, mas dois bebês. Sim, são gêmeos. A futura mamãe está que não se aguenta. Imagina a combinação de roupas, penteados, carrinhos, brinquedos. Tudo em dobro. O pai também está perdido em pensamentos. E também pensa na dobradinha: alimentação vezes 2, saúde vezes 2, choro vezes 2, noites sem dormir vezes 2... Tudo em dobro, é verdade, porém não se pode esquecer que o amor também é vezes dois, o sorriso vezes dois, o carinho vezes dois...

Todos estão em casa: os pais Amélia e Nelson, os gêmeos Carlos e Antônio, os familiares que não perderão esse momento por nada, os vizinhos que adoram a família e que também contavam nos dedos a chegada do grande dia, o pessoal da igreja que preparou um culto especial em forma de boas-vindas para os mais novos membros da família e até um penetra que vê a muvuca que está na casa e por curiosidade resolve entrar.

Passados horas, choros, abraços, discursos e tudo mais que faz parte de uma grande festa, todos vão para casa. Todos menos as sogras e os sogros. Como a filha e o filho são pais de primeira viagem, eles resolvem ficar para dar uns conselhos. Bem, na verdade isso é apenas desculpa para poder ficar um pouco mais ao lado dos netos que são, verdadeiramente, anjinhos. Ambos cabeludos e fofuchos.
O tempo passa e os gêmeos Carlos e Antônio crescem cada vez mais amigos, cada vez mais unidos, cada vez mais irmãos. Eles simplesmente se adoram e fazem tudo juntos. Eles sempre...

“- Meu filho, eu já conheço essa parte da história. Eu os vi crescer, lembra? Depois que eu perdi contato. Dá para pular essa parte da infância?
- Não, tia. Não dá. A senhora pode conhecer a história, mas o pessoal que nos lê não.
- Tá bom, então. Mas vai logo com essa parte, por favor.
- Vou tentar. Bem, como eu dizia...”

... acordam e vão dormir no mesmo horário; estudam no mesmo horário e na mesma sala; contam e riem da mesma piada; gostam do mesmo tipo de comida. A única coisa que fazem separados é namorar. Sim, eles têm namoradas diferentes. E sim, elas sabem distinguir entre um e outro, sabem dizer quem é quem.

Tudo parece perfeito e maravilhoso. Como dito anteriormente, eles se adoram. É difícil presenciar uma discussão entre eles. Eles não brigam por motivo algum. Bem, pelo menos não brigavam.

O ano agora é 2018...

"- Tia! Tiaaaa!!!
- Hã?!? O quê? Quando? Por quê?
- Tia, a senhora estava dormindo.
- Quem, eu?
- Sim, a senhora.
- Que nada! Eu estava meditando.
- Que mané meditando o que. Confessa, tia.
- Tá bom. Eu confesso. Estava dormindo. Também, essa história não acaba nunca.
- Tia, vou entrar na parte onde eles deixam de ser tão unidos.
- Ah, é. Bom, essa parte me interessa.
- Então, acorda!!! Não vá dormir de novo.
- Não, tô bem. Pode continuar a história.
- Ok. De novo, como eu dizia..."

Como está escrito acima, o ano é 2018. Eles não são mais crianças. Ambos acabaram de completar 18 anos. Antônio está na sala assistindo seu programa predileto quando Carlos entra na sala.

- Mano, chega mais. Está passando o novo episódio de The Walking Dead. Vamos assistir.
- To afim não. To com fome. Quero jantar. E mais, TWD está ficando sem graça. Parece que o Rick vai morrer.
- Nããããão, mano. Sem spoiler.
- Eu disse parece que ele vai morrer e não que ele irá morrer.
- Anyway, vamos assistir. Senta e...

Antônio para de falar. Ele não acredita no que os seus olhos estão vendo. Na verdade, ele não quer acreditar. Ele desliga a televisão para falar com Carlos. E para ele desligar a TV no meio do seu programa predileto é porque a situação é séria.

- Que droga é essa?
- Do que você está falando?
- Dessa camiseta aí.
- Ah, você viu.
- Não, estou vendo agora. E não quero acreditar.
- Acreditar no que?
- Que você apoia esse cara.
- Bem, apoiar apoiaaaaar eu não apoio, mas acho que ele pode mudar o Brasil.
- TÁ MALUCO?

Carlos não tinha certeza, mas aquela deveria ser a primeira vez que o seu irmão gritou com ele.

- ESSE CARA É DOIDO!!!
- Hey, posso saber o porquê do tom de voz?
- Desculpa, mano.
- Assim é melhor.
- Você sabe que sou um cara da paz, mas essa camiseta... esse cara nessa camiseta... bem, ele me tira a paz.
- Se não for ele, que será então.
- QUEM????
- OPA, VAI GRITAR DE NOVO?

Agora é o Carlos que aumenta o tom de voz.

- Que pergunta mais idiota você me faz. É claro que o outro cara que está concorrendo com ele é beeeem melhor e pode nos colocar no trilho de novo.
- O outro cara? Hahahaha!!! O outro ou os outros?
- O que você quer dizer com isso?
- O cara é manipulado, todos sabem disso. Só você e os outros cegos que não querem enxergar. Está na cara.
- OLHA LÁ COMO VOCÊ FALA DELE.

Antônio dá um salto do sofá e fica de frente com Carlos. Os dois estão cara a cara, nariz a nariz, bafo a bafo.

- Mano, você escovou os dentes?
- Claro que sim.
- Não parece. Tá com o mesmo cheiro do seu queridinho. Cheiro de podre.

Antônio não aguenta a ofensa e então começa a briga. Ele é mais forte do que o Carlos. Não muito, mas é. Ele segura Carlos pelo pescoço e começa a soca-lo. Carlos tenta se desvencilhar, mas o seu irmão é forte. Com o barulho da luta, Nelson sai do banheiro onde estava calmamente pensando na vida enquanto lia o jornal do dia anterior e vai até a sala ver o que está acontecendo. Fica estarrecido quando flagra os seus filhos enroscados um no outro e dá um berro. Aliás, o primeiro berro que profere nos últimos 15 anos. Ele sempre foi calmo, mas aquela cena o tira do sério.

- O QUE ESTÁ ACONTECENDO AQUI???

Antônio automaticamente solta Carlos. Não lembra da última vez que o seu pai gritou com eles. Bem, lembra sim. Foi o dia em que os dois, brincando de pega-pega, quebraram o vaso que ficava na mesa-centro da sala. Wow!!! Isso foi há quinze anos.

- ANTÔNIO, O QUE É ISSO? OLHA SÓ O NARIZ DO SEU IRMÃO.

Carlos está com a camiseta toda ensanguentada e com cara de muitos poucos amigos. Ele bufa como boi bravo. Seus olhos são como facas e estão apontadas para Antônio. Esse sentimento de raiva também é novo para Carlos. Nunca havia sentido isso, muito menos se tratando do seu irmão que ele adora.

- Foi ele quem começou pai.
- Como assim? Começou o que?
- Olha só a camiseta que ele está usando!

Nelson tenta decifrar qual a imagem que está por baixo do mar de sangue que ficou a camiseta de Carlos. Ele cerra os olhos e mesmo assim não consegue ver com clareza o que é.

- Antônio, diga logo o que é pois não consigo ver nada.
- É A FOTO DO OUTRO LÁ.

Carlos dá um grito. Ele não aguenta mais de raiva e dor. Quer bater e muito no seu irmão. E essa raiva toda faz com que ele ignore a presença do pai. Nunca que em sã consciência ele iria gritar com o seu pai.

- TO USANDO A CAMISETA COM A FOTO DELE. E DAÍ?

Nelson fica pasmo com a audácia do seu filho em: primeiro, gritar com ele e, em segundo, usar a camiseta com a foto do outro lá. Ele não sabe o que é pior.

- Rapaz, olha pra mim.

Carlos olha, mas com apreensão.

- Você sabe quem sou eu?

Carlos está mudo.

- Vou perguntar novamente, pois acredito que não tenha ouvido da primeira vez.  Você sabe quem sou eu?
- O senhor é o meu pai.
- Exatamente. E isso é maneira de falar com o seu pai?
- Não, senhor. Mas foi o Antônio que...
- Não quero saber. Da próxima vez que você gritar comigo, bem será a última vez. Estamos entendidos?
- Sim, senhor.

Antônio dá uma pequena risada. Nelson percebe na hora.

- E você? Está rindo do que?
- De nada.
- Não é o que parece. Por um acaso está rindo da situação do seu irmão que está com o nariz sangrando?
- Não, senhor.
- Ah, que bom, pois não é nenhum pouco engraçado.

Enquanto eles conversam sobre o ocorrido, Amélia adentra a sala e vê os seus dois filhos amados. Um está com o cabelo todo desarrumado. O outro, além do cabelo desarrumado, está com a camiseta toda ensanguentada. Seu instinto de mãe a faz correr em direção do pai. Como qualquer mãe faria naquele momento, ela acintosamente defere um tapa em Nelson, que não entende nada.

- Hey! Por que você me bateu?
- Por que???? Olha a situação dos meninos.
- O que que tem a situação dos meninos?
- Você deve ter batido neles. Olha como está o meu Carlinhos. Tadinho!!! Vem aqui com a mamãe, meu bebezinho.

Amélia puxa Carlos para o seu lado e começa a acaricia-lo. Depois pega um pano e começa a limpar a sua camiseta.

- Pensando melhor, tira essa camiseta, Carlinhos. Vou no seu quarto buscar uma nova, limpinha e cheirosinha. E quando eu voltar quero saber direitinho o porquê de você ter batido nos meninos, ouviu senhor Nelson Batista de Oliveira Filho.
- Mas eu...
- Sem mas. Quando eu voltar a gente conversa.

Enquanto Amélia vai para o quarto, Nelson...

"- Hey. Parou por quê?
- Estou checando se a senhora está acordada.
- Se estou acordada? Mas é claro que sim. Não quero perder nenhum detalhe.
- Tá gostando da história, tia?
- Gostando??? Estou adorando. Eu daria mil Reais para ver a Amélia dando um tapa na cara do Nelson. Isso é surreal. Bem, continua. Para não.
- Ok, como dizia..."

Enquanto Amélia vai para o quarto, Nelson conversa com os meninos e pede para que eles esclareçam para a mãe deles o que realmente aconteceu.

A mãe do Carlinhos e do Toninho volta com uma camiseta nova, limpinha e cheirosinha e ajuda o seu filhinho a coloca-la. Enquanto isso Antônio explica o que aconteceu. Amélia se desculpa com Nelson e diz que irá compensa-lo mais tarde depois que os meninos estiverem dormindo. Nelson gosta da ideia e pensa que não foi tão ruim assim ter levado um tapa.

Quando Amélia pega a camiseta para checar a foto do outro lá, ela não se aguenta e começa a bater em Carlos. Antônio olha para Nelson que olha de volta para Antônio. Os dois ficam ali perplexos, sem entender o porquê de o Carlos estar apanhando mais uma vez.

O que os dois não sabem é que Amélia havia prometido que não tomaria partido nas eleições. Irá votar para quem o coração apontar. Porém, não pode deixar que seu filho de ouro defenda um homem com ideias tão retrógradas.

Nelson então intervém. Puxa Amélia para longe do Carlos.

- Oh, mulher. O que é isso? Endoidou de vez?
- Quem está doido aqui é o seu filho. Como pode colocar uma camiseta dessas?
- E daí? Deixa o menino votar em quem ele quiser.
- Olha, eu pensava assim, mas mudei de ideia. Esse aí não.
- Ele vai votar em quem então.
- SEI LÁ, MAS ESSE AÍ DEFINITIVAMENTE NÃO.

Amélia dá um grito ensurdecedor. Todos, de forma atônita, olham para ela. Nelson não acredita no que vê nem no que ouve. Ele se pergunta o que está acontecendo com sua família. Amélia então começa a falar.

- Me perdoem. Eu não sei o que está acontecendo comigo. Eu nunca fui assim.
- Calma, meu amor. Essas últimas semanas têm sido muito difícil. Os nervos estão a flor da pele.
- Sim, eu sei disso. Mas isso não deveria afetar nosso psicológico.
- Não deveria, mas está.

Nelson abraça Amélia que desaba a chorar. Antônio então se junta aos dois e, sentimental como a mãe, começa também a chorar. Nelson, metido a valente, reluta, mas depois de alguns segundos sente as primeiras lágrimas correrem pelas bochechas sujas com a labuta do dia.

Todos abraçados e pensando no que havia acontecendo.

"- Peraaaaa. Como assim todos? E o Carlos? Você não citou o nome dele.
- Exatamente, tia. Está prestando atenção, hein?
- Opa. Não consigo nem piscar. Mas e aí? O que aconteceu com o Carlos?"

Carlos não é sensível como o seu irmão. Enquanto eles se abraçam na sala, ele vai para o seu quarto, pega sua mochila verde preferida e começa a arrumar suas coisas. Na sua cabeça aquela é a primeira e última vez que seu irmão e sua mãe põem a mão nele.

Quando os três dão conta, Carlos já tinha saído de casa. Nelson e Amélia vão na casa de todos os parentes, dos amigos dele, da sua namorada e nada. Vão até a delegacia e nada. Vão também em vários hospitais, mas nada também.

O tempo passa e há uma transformação radical na família. Não há mais alegria. Ela partiu junto com o Carlos. Nelson é mandado embora, pois fica dias e dias fora, atrás do seu filho, e com isso a empresa não pode fazer nada. Até ajudam no início, mas depois a situação fica insustentável. Amélia emagrece. Não come quase nada. Por vezes é levada para o hospital para tomar soro. E Antônio, bem, esse sofre e muito. Cresce sem amigos, sem namoradas, sem vontade de viver. A única coisa que o mantem vivo é a esperança de encontrar o seu irmão.

Então ele aparece.

"- OH MEU DEUS!!! O CARLOS APARECEU???
- Não, tia. Um amigo dele apareceu.
- Ah, pensei que era ele.
- Tia, to quase acabando. Calma aí.
- Tá bom. Desculpa."

 Certo dia alguém toca a campainha. Nelson sai correndo para atender. A sua frente está um rapaz malvestido e acatingado. Ele se chama José e diz que tem notícias sobre o Carlos. Amélia mal ouve o nome do seu filho e desce correndo do quarto. Coloca José para dentro de casa e pede para que ele fale logo.

Carlos está morto e José era seu amigo de rua. Sim, Carlos tinha se tornado um morador de rua. Tinha comprado uma passagem para o Rio de Janeiro, sua cidade preferida, e lá ficou morando nas calçadas da cidade maravilhosa. Fez amizade com José. Os dois não se desgrudavam. Carlos disse que José seria o seu novo irmão.

O tempo foi passando e Carlos foi ficando cada vez mais calado, cada vez comendo menos, até que passou mal e foi levado para o hospital onde veio a falecer. José fuçou nas coisas dele e encontrou o endereço daqui.

Antônio, ao ouvir a notícia do falecimento do irmão, se trancou no quarto. Passadas algumas horas, veio também a falecer. Ninguém sabe o motivo. Com certeza não foi suicídio. Os médicos dizem que morreu de desgosto.

"- Bem, essa é a história de dois irmãos que se amavam e acabaram brigando, se separando e morrendo.
- Wow. Que triste, hein?
- Muito.
- Mas diga uma coisa.
- Falo até duas, tia.
- Tudo isso por causa daquele e do outro lá?
- Exatamente.
- Aff!!!"

                                             * * * * * * * * * * * * * * *

Você pode pensar que essa história é fictícia e um pouco carregada no drama.

Será?

O que tem acontecido nos últimos meses?

Conhecidos, sejam eles familiares ou amigos, têm se engalfinhado em rede social como verdadeiros gladiadores.

Vivemos num regime democrático onde todos temos o direito sagrado de opinar e votar em quem acharmos que seja legítimo receber nosso voto.

O que não pode é o cidadão defender sua opinião com agressividade e total falta de senso e educação, a ponto de fazer chacota e até mesmo agredir não apenas verbalmente, mas também fisicamente.

Fica a pergunta para todos nós:

Será que vale a pena?

Que você possa votar de forma consciente naquele que você acredita estar melhor preparado para dirigir nossa nação.

Quem está preparado?

Bem, a sua consciência irá lhe dizer.

E que no final da votação a DEMOCRACIA seja a grande vitoriosa e que nós BRASILEIROS possamos ter uma BRASIL melhor para TODOS!!!!

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