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segunda-feira, 29 de junho de 2015

Nunca na história desse país


Escrito por Edson a.k.a. Eddie




Meio-dia. 2 horas para o impacto. LULA e DILMA conversam no Palácio da Alvorada. LULA está pensativo, andando de um lado para outro.

LULA
Vou me entregar !!!

DILMA
O que é isso, companheiro ?!?!?!? Mas por quê?


DILMA se aproxima de LULA. Ele está cabisbaixo. Está com o semblante cansado, como se estivesse passado a noite inteira em claro. DILMA põe a mão direita no ombro de LULA. Ele se esquiva.

LULA
Não consigo mais segurar. Foram anos recebendo dinheiro de empreiteiras.

DILMA
Se você fizer isso será um escândalo. Milhões ficarão decepcionados com você.

LULA dá um murro na mesa. A garrafa de 51 cai no chão. O carpete recebido de presente do presidente da Rússia, Vladimir Putin, amortece a queda. LULA chega perto de DILMA e a agarra pelos braços, balançando-a de um lado a outro enquanto grita.

LULA
E VOCÊ ACHA QUE EU NÃO SEI DISSO? O POVO CONFIA EM MIM. SEMPRE CONFIOU. E EU OS DECEPCIONEI.

DILMA olha para ele com uma cara de assustada. Ele a solta,pega a garrafa de 51 do chão, pega uns limões da geladeira, um pote de açúcar e prepara uma caipirinha. Mais calmo, se senta no sofá que foi presente do presidente norte-americano.

LULA
Me desculpe, companheira. Estou nervoso. Você não tem culpa disso.

Ele se aproxima de Dilma, a pega pela mão e juntos se sentam no sofá.

LULA
Lembro como se fosse ontem:eu entrando no seu gabinete quando você ainda era minha Ministra de Minas e Energia. Como dizem no popular mesmo? Ah... “Ninguém te dava nada. Nem um real”. Mas eu acreditei em você. Lembra disso?

DILMA
Como esquecer o dia que alguém te pergunta: “Gostaria de ser presidente do Brasil?”. Lembro que entrei em choque. Achava que ser Ministra seria o ápice da minha carreira.

LULA se levanta e começa a vociferar. É possível ver algumas espumas saírem de sua boca.

LULA
A IMPRENSA DE MERDA E A ELITE BRANCA BRASILEIRA CHAMAVAM VOCÊ DE POSTE. DIZIAM QUE SUAS CHANCES ERAM ZERO. QUEBRARAM A CARA. VOCÊ FOI ELEITA E RE-ELEITA. PARA UM POSTE ATÉ QUE NÃO FOI NADA MAL.

LULA e DILMA trocam olhares. Por alguns segundos ficam em silêncio. Então, do nada, começam a gargalhar alto, num claro sinal do efeito da caipirinha. Lula desafrouxa o nó da gravata e pega mais um pouco de caipirinha.

Depois de boas gargalhas DILMA fecha o rosto, numa demonstração de preocupação. LULA para de gargalhar e se aproxima de DILMA.

LULA
O que foi, companheira?

DILMA
Posso fazer uma pergunta?

LULA
Claro. Até duas.

DILMA
Mensalão.

LULA
O quê que tem?

DILMA
Você sabia?

LULA
Claro que eu sabia.

DILMA dá um grito.

DILMA
EU SABIA. EU SABIA.


LULA
Na verdade, eu nunca participei de nenhuma reunião. Nunca discuti valores com nenhum membro do senado ou congresso. Porém, depois de acordado, o Zé Dirceu me deixava por dentro de tudo: valores, partidos envolvidos, deputados e senadores envolvidos...

DILMA
E por que nunca disse nada? Por que você defendeu os mensaleiros em rede nacional?

 LULA
Não tive escolha. Eu não queria e não podia ferrar o partido. Vários companheiros que estão comigo desde a primeira vez que me candidatei à presidente em 1989. Não poderia decepciona-los.

DILMA
E o povo brasileiro?

LULA
Pior ainda. Eles me adoram. Eu ando por esse Brazilzão afora e vejo o quanto sou querido. E isso me deixa muito triste. Não queria decepcioná-los também.

DILMA
Mas você já os decepcionou.

LULA
E você acha que não sei disso? Mas essa era a única forma de ter nossas ideias aprovadas pelo Congresso.

DILMA
Mas você foi eleito para ser diferente.Não mais do mesmo.

LULA fica quieto. Parece absorver as palavras. Dilma pensa muito bem nas próximas palavras que irá usar.

DILMA
Você traiu o povo brasileiro quando disse que não sabia de nada.

LULA
Eu sei. Mas nunca na história desse país o PT tinha chegado tão longe. Eu não podia interromper nosso plano de dominar a America do Sul e fazer do Brasil o país mais importante por essas bandas de cá.

DILMA
Eu até entendo, mas a que preço.

LULA
Eu sei. Por isso que vou me entregar.

DILMA
Mas por que agora?

LULA
Porque o mundo irá acabar a exatamente...

Lula olha o relógio. São 13 horas. Uma hora para o impacto que irá dizimar a Terra da face do universo.

LULA
1 hora. Fiquei pensando a noite toda e o povo brasileiro merece uma explicação.

De repente ele levanta a voz, demonstrando muita raiva.

LULA
O POVO E NÃO ESSA MÍDIA MALDITA QUE TRABALHA PARA ESSE ELITE BRANCA. O POVO.

Dilma se aproxima de Lula mais uma vez. Tira o copo da mão dele e o abraça.

DILMA
O senhor está fazendo a coisa certa.

Barulho de carros estacionando. Dilma olha pela janela. São três vans da Polícia Federal. Dilma se assusta.

DILMA
A polícia está aqui.

LULA
Sim. Eu que chamei.

Dilma dá um abraço bem apertado em Lula.

DILMA
Dará tudo certo, companheiro. Eu vou visitá-lo na prisão.

LULA
Não será necessário.

DILMA
É verdade. O mundo vai acabar.

LULA
Não é por causa disso.

DILMA
É por causa do que então?

LULA
Você vem comigo.

Dilma faz cara de surpresa. Não entende o que está acontecendo.

DILMA
Como assim eu vou com você?

LULA
Eu fiz duas confissões: a primeira sobre o mensalão. A segunda sobre a corrupção nunca vista na história desse país. Estou falando do caso Petrobras.

Dilma faz cara de tonta.

LULA
Não adianta fazer essa cara de tonta. Todos sabem que você sabia de todas as falcatruas envolvendo o maior escândalo de corrupção desse país. Nunca na história desse país um governo se viu tão envolvido e atolado em corrupção. E nunca se roubou tanto.

DILMA
Mas eu não sabia de nada. Eu juro.

LULA
Claro, claro. E eu não sabia que os senadores e deputados votavam a favor do governo em troca de valores recebidos mensalmente. Pratica essa que ficou conhecida como mensalão.

Dilma está atônita. Ela está sem palavras. Ela fica por 2 minutos olhando para o nada. De repente sai correndo e abre a gaveta da sua mesa. E de lá puxa uma pistola calibre 38. Lula começa a rir. Efeito da caipirinha.

LULA
Você está maluca? Quer o que com isso?

DILMA
Eu não posso ir para a cadeia.

LULA
Deixa de ser besta. Você não irá para a cadeia. Haverá primeiro um julgamento. E isso poderá levar meses, anos até.

DILMA
Sim. Mas o mundo acabará...

Dilma olha para o relógio na parede que foi um presente do presidente da África do Sul. É a cabeça de um leão que foi caçado e morto pelo próprio presidente. Ela olha para a boca aberta do animal empalhado.

DILMA
... em meia hora. Eu não posso ser presa. Esse não pode ser o meu último ato.

LULA
Aceite, companheira. Saiamos desse mundo dignamente.


DILMA
Não. O que pensarão de mim?

DILMA abaixa a arma e começa a chorar. Lula se aproxima e tenta consolá-la. Os dois então, abraçados, choram juntos copiosamente. Até que ouvem um barulho na porta.


POLÍCIA
POLÍCIA FEDERAL. ABRAM A PORTA AGORA OU IREMOS ARROMBÁ-LA.

Silêncio. Nenhum dos dois se mexe.

 POLÍCIA
ABRAM LOGO ESSA MERDA. SABEMOS QUE ESTÃO AÍ.

LULA
É melhor abrirmos. Vamos acabar logo com isso.

DILMA
Nããããããããooooo !!!

Dilma empurra Lula e aponta a arma para a porta. A polícia arromba a porta e dois policiais com coletes escritos PF entram. Os dois fortemente armados.

POLÍCIA
LARGA A ARMA PRESIDENTE.

DILMA
NÃO LARGO. E NÃO É PRESIDENTE. É PRESIDENTA. COM A.

POLÍCIA
NA VERDADE PODEMOS UTILIZAR AS DUAS FORMAS. AGORA, PRESIDENTA, POR FAVOR, ABAIXE A ARMA.

DILMA
VOU ABAIXAR P**** NENHUMA.


POLÍCIA
PRESIDENTE, DIGO, PRESIDENTA, SE VOCÊ NÃO BAIXAR A ARMA NÓS TEREMOS QUE ATIRAR. E EU NÃO QUERO FAZER ISSO, POIS SOU PETISTA.

DILMA
NÃO IMPORTA SE VOCÊ É PETISTA. NÃO VOU BAIXAR A ARMA. E PODE FICAR TRANQUILO PORQUE VOCÊ NÃO PRECISARÁ ATIRAR.

O policial não entende o que Dilma diz. Como assim não precisará atirar. E Lula, que estava vendo tudo enquanto tomava mais um pouco de caipirinha, também não entendeu.

LULA
Companheira, por que você disse que não será necessário atirar? Você irá se entregar?

DILMA
Não.

E dizendo isso ela aponta a arma para a própria cabeça e atira. Lula quando percebe o que ela irá fazer, tenta evitar pulando em sua direção, mas é tarde. A presidenta Dilma, como último ato, tira a própria vida. Lula a segura nos braços.

LULA
Nãããooo. Por que fez isso, companheira? Por quêêê?

Lula está inconsolável. Ele nunca havia pensado num final tão trágico.

POLÍCIA
Sr. Presidente.

Lula olha para o policial. Com os olhos marejados ele diz adeus a sua companheira. Se levanta e estica os braços no gesto de quem se entrega. O policial, também com os olhos marejados, coloca as algemas no ex-presidente da Republica.

LULA
Por que choras, policial? Você admirava a Dilma?

POLÍCIA
Sim, mas não é por isso que choro?

LULA
Por que então?

POLÍCIA
Porque estou prendendo o senhor. Nunca pensei que iria fazer isso. Estou me sentindo muito mal. Eu e minha família amamos o senhor. O que estão fazendo com o senhor é uma covardia. O senhor é inocente. Tenho certeza.

LULA
Obrigado, meu rapaz. Mas acontece que eu não sou inoce...

POLÍCIA
ESSA MÍDIA BRANCA E ELITE DE MERDA. ELES FIZERAM O QUE FIZERAM E FINALMENTE CONSEGUIRAM UMA MANDATO DE PRISÃO CONTRA O SENHOR. SE EU PEGO QUEM FEZ ISSO...

LULA
Meu jovem, ninguém me denunciou. Eu mesmo que...

Quando Lula começa a explicar para o rapaz que ele mesmo ligou para a Polícia Federal e confessou que recebia dinheiro das empreiteiras, um barulho ensurdecedor toma conta dos céus. Todos saem para checar o que está acontecendo. Nos céus uma bola de fogo. Parece distante, mas a cada segundo que passa se aproxima mais. O fim está próximo. Quando menos se espera ele atinge a superfície, destruindo tudo, como uma bomba nuclear, mas 50 vezes mais potente.

DONA MARISA
Lula, você está bem meu amor?

Lula acorda todo ensopado.

LULA
Marisa???

DONA MARISA
Sim, amor. Você deve ter tido um pesadelo.

LULA
Sim. E que pesadelo. Sonhei que um meteoro acertava a Terra, acabando com a vida que hoje conhecemos.

DONA MARISA
Nossa. Que coisa. Vou pegar um pouco de água com açúcar pra você.

LULA
Obrigado, amor. Aahhh...

DONA MARISA
O que foi?

LULA

Pega o telefone e o número da Polícia Federal. Preciso fazer uma ligação.









quarta-feira, 17 de junho de 2015

Sam, o mico-leão-dourado



Nããããããããããoooooooo !!!

3.45 da manhã. Tudo escuro. Olho para esquerda. Nada. Olho para direita. Nada. Olho para cima e para baixo. Nada. Onde estou? Tento me mover. Nada. Tento falar alguma coisa. Nada. Tento gritar. Nada. Como será que vim parar aqui?  Alguém acende a luz. Posso enxergar agora. Conheço aquela mesa. E aquela cadeira. E aquele laptop. Estou no meu laboratório. Olho para direita e vejo Sam, meu macaco de estimação. Sam é um mico leão-dourado. Amo aquele macaquinho. Ele é engraçado e sempre bem humorado. Tento dizer algo para ele. Nada. Não consigo pronunciar uma palavra sequer. O que sai da minha boca são apenas meia palavras. Sam olha pra mim. Percebo que sua boca está vermelha. Deve estar comendo as framboesas que sempre pego pra ele. Ele me olha fixamente. Me encara. Um olhar sério que não me lembro ter visto. Olho para sua mão. Tem alguma coisa ali. Brilhando. Parece ser uma... faca. Mais precisamente um bisturi. Sam está segurando um bisturi. O meu bisturi.

Um pouco mais cedo no mesmo dia...

O dia não foi dos piores. Recebemos a visita de um grupo de alunos de uma escola municipal que fica há 20 quilômetros de distância. Eles vieram num ônibus velho, caindo aos pedaços. Mas isso não importou em nada para aquelas crianças, pois tiveram o dia mais feliz da vida delas. Passaram o dia brincando com vários animais, principalmente com os macacos e com o gorila Tum Tum, que veio diretamente da Republica Democrática do Congo. Ele recebeu esse nome devido aos seus passos pesados, possíveis de serem detectados a metros de distância. Tum... Tum... Tum... Tum...

Trabalho num laboratório no meio da selva amazônica. Sou cientista com mais de 10 anos de experiência e estudos no campo neurológico. Tento desvendar o fascinante e complexo mundo dos neurônios. Sou fascinado por essa área desde os 10 anos de idade, quando assisti ao filme/documentário “Faces da Morte”. 
As imagens do documentário ainda estão vivas no meu córtex frontal. Lembro como se fosse hoje: um canibal que vive nas selvas da Ásia Central comendo o cérebro de um macaco. O engraçado era que o macaco estava vivo enquanto o homem fazia sua refeição noturna. Lembro dos meus amigos todos com cara de nojo. Uns chegaram até a vomitar. Não eu. Eu estava fascinado. O homem cortando o cérebro do pobre e inocente macaquinho e o mesmo ali, de olhos abertos e assustados. Como aquilo era possível?

A partir daquela cena resolvi estudar essa parte do corpo e descobri coisas incríveis:

1. O cérebro possui 160.000 quilômetros de veias sanguíneas, o suficiente para dar a volta na Terra quatro vezes;

2. Ele tem 100 bilhões de neurônios, as células conhecidas como a massa cinzenta que processa a informação;

3. 20% do oxigênio inalado pelo ser humano é usado pelo cérebro; 

4. Se o cérebro fosse um HD de computador ele teria 4 TB de informação;

5. Os homens processam primeiro a informação do lado esquerdo do cérebro. Já as mulheres fazem essa tarefa com os dois lados do cérebro simultaneamente;

6. A afirmação de que homens são racionais e mulheres são emocionais é verdadeira. Isso acontece porque as mulheres têm uma maior parte do sistema límbico, que controla as emoções. Porém, os homens têm uma porção maior da parte inferior, responsável por controlar as habilidades de cálculos.

7. Quando o cérebro sofre algum dano acidental, podem acontecer síndromes que levam o ser humano a ouvir grandes explosões, pensar que tem mais membros do que realmente tem e ficar incapaz de mover os membros quando acorda. Isso acontece porque o cérebro ainda está em repouso.

8. A idéia de que humanos usam apenas 10% do cérebro é mito. Toda parte do cérebro tem uma função e trabalha o tempo todo.

9. O cérebro é dividido em dois hemisférios. Enquanto o esquerdo controla os pensamentos analíticos, o direito coordena os pensamentos criativos.

10. Aprender uma segunda língua antes dos 5 anos pode mudar o desenvolvimento do cérebro para o resto da vida. As crianças adquirem a capacidade de desenvolver mais massa cinzenta quando alcançam a idade adulta.


Mas não pense que minha jornada até o estudo do cérebro foi fácil. Para poder fazer um curso específico de Neurociência (ramo da ciência ou conjunto de conhecimentos que se refere ao sistema nervoso) me formei primeiro em Medicina (conjunto de conhecimentos relativos à manutenção da saúde, bem como a prevenção, tratamento e cura das doenças, traumatismos e infecções) e depois estudei Psicologia (ciência que trata dos estados e processos mentais, do comportamento do ser humano e de suas interações com um ambiente físico e mental). Com esse conhecimento prévio, fiz um curso de pós-graduação em Neurociência na Universidade de São Paulo.  

Foram anos árduos de muito esforço físico e mental. Dias e noites em claro, buscando entender o relacionamento do cérebro com o sistema nervoso. Mas valeu a pena. Depois de conseguir boas notas, fui patrocinado por um gigante do ramo farmacêutico e juntos fincamos um laboratório no meio da Amazônia selvagem. Não foi fácil conseguir a papelada devido à grande burocracia que empaca nosso país, mas depois de quase um ano nosso laboratório saiu do papel, assim como minhas idéias.

Comecei meus estudos sozinho. Confesso que foi assustador no inicio. Principalmente à noite quando você ouve sons, mas não consegue saber o que está emitindo aquele som. A pior parte é ficar imaginando se o animal é pequeno ou grande, inofensivo ou perigoso. Eu particularmente não tenho medo de animais. Porem há um que me dá calafrios: cobras. E na nossa floresta há cobras dos mais variados tamanhos e cores. Felizmente, nunca fui picado por uma venenosa. Fui uma vez surpreendido por uma que estava escondida na cozinha. Chegou a me picar, mas não era peçonhenta. Passado o susto, fui me acostumando com os sons.


Trabalho com muitos animais, o que é bom e ruim. Bom porque tenho o prazer de presenciar todo o poder do Criador. São animais lindos. Exóticos. Por exemplo: onça pintada, arara-canindé, mariposa atlas, garça real, araçari-castanho, entre outros. Mas o meu animal preferido e objeto dos meus estudos é o macaco. E podemos encontrar as mais variadas espécies: macacos-da-noite, guaribas, macacos-aranha, macacos-pregos, sagüis, micos-leões, macacos-de-cheiro, etc. O trabalho se torna ruim quando preciso sacrificar alguns macacos. Faço isso para estudar o cérebro. E nesse caso o animal que tem o cérebro mais próximo ao nosso é o macaco. Nunca gostei de fazer isso, mas sempre que preciso passar por esse momento, penso no bem maior que está sendo feito em prol da humanidade. Assim fico com a consciência menos pesada.

As crianças foram embora. Os meus assistentes também. Estou sozinho. Quer dizer, mais ou menos. Meus amigos animais estão comigo. Sam está lá fora. Aliás, há horas que não o vejo. Deve estar namorando. Antes de tomar banho, dou uma olhada nos meus e-mails e também checo se alguém postou algo novo no Facebook. 2 mensagens da minha mãe e nenhum pedido de amizade. Por que ninguém quer ser meu amigo? Olho para o relógio. Quase meia noite. Preciso comer. Abro a mini geladeira e pego o pedaço de pizza que compramos ontem para celebrar meu aniversário. Pego também o que sobrou de uma garrafa de coca. Começo a me deliciar com a pizza do dia anterior e coca sem gás quando escuto: Tum... Tum... Tum... Tum... Será que Tum Tum escapou? Um dos meus assistentes, muito provavelmente o Caio, esqueceu de fechar a jaula. Penso em sair para ver o que está acontecendo. Não é mais preciso. Tum Tum está dentro do laboratório.

- Boa noite, Doutor.

Não acredito no que acabo de ouvir. Tum Tum falou.

- Boa noite, Doutor.

Ele repete a frase. E eu continuo não acreditando. Como assim Tum Tum está falando? Ele é um gorila. Macacos não falam (a não ser os que estrelam o filme Planeta dos Macacos). Deve ser a pizza. Ou a coca sem gás. Cuspo o pedaço de pizza da boca e jogo a coca fora.

- Não vai responder, Doutor?

Tum Tum faz uma cara de mau. Melhor responder.

- Bo... bo... boa noite... Tum Tum.

- Pensando bem, Doutor. Boa noite para mim. E não tão boa para você.

- Como assim?

- O doutor logo verá.

Tum Tum se aproxima e sem nenhum aviso me dá um soco. Desmaio instantaneamente.



3.45 da manhã. Hora atual.


- Olá, Doutor.

Sam, meu mico leão-dourado, tem uma bela voz. Mas soa um pouco que sinistra. Do meu lado está Tum Tum. Do outro lado, macacos que estavam enjaulados. Na minha frente, Sam.

- Dormiu bem?

- Sam, o que está acontecendo aqui?

- Eu odeio quando respondem uma pergunta com outra pergunta.

Sam me dá um soco no estômago. Fico sem ar por 10 segundos. Nunca imaginei na minha vida que um soco de um mico leão-dourado doesse tanto.

- Perguntei se você dormiu bem.

- Sim, Sam, sim. Eu devo estar maluco. Estou conversando com um macaco.

- Está maluco não, doutor. Agora, pergunte se eu dormi bem.

- O quê?

Levo outro soco no estômago. Agora seguido por um no rosto.

- EU DISSE PARA PERGUNTAR SE EU DORMI BEM !!! ODEIO REPETIR !!!

- Ok... ok... Você dormiu bem???

- Não. Eu não durmo bem desde que cheguei aqui.

- Como assim? Sempre te tratei bem.

- Exatamente. Sempre me tratou bem. Mas e os outros macacos??? Quantos o doutor matou? Quantos não sacrificou em nome da Ciência? Eu sinceramente não me lembro. Perdi a conta de quantos amigos perdi.

- Mas Sam, faz parte do meu trabalho.

- O doutor sente prazer nisso?

- O quê?

Mais um soco no estômago.

- EU PERGUNTEI SE VOCÊ SENTE PRAZER EM MATAR OS MEU AMIGOS, MEUS IRMÃOS PRIMATAS???

- NÃO. CLARO QUE NÃO.

- E PORQUE O FAZ?

A conversa está tensa. Posso ver o ódio nos olhos do Sam. Falta pouco para ele enfiar aquele bisturi na minha barriga. Preciso tomar cuidado com as palavras. E com o tom da minha voz.

- Sam, sinto muito. Gostaria que fosse diferente, mas eu precisava... preciso estudar o cérebro para tentar entender como o nosso cérebro, o do ser humano, funciona. Eu nunca senti prazer algum nisso. Aliás, essa sempre foi e sempre será a pior parte do meu trabalho.

- Mas não teria como fazer o seu estudo SEM TER QUE MATAR MEUS POBRES AMIGOS ???

- Não. Infelizmente.

- Ok. Ok. Bem, essa conversa todo me deu uma fome. O doutor está com fome?

- O quê?

Dessa vez não tomo um soco. Porém Sam coloca o bisturi próximo a minha garganta. E pergunta novamente.

- Está com fome???

- Sim.

- Pois bem. Eu trouxe algo para você degustar. Tum Tum. Traga o prato com a iguaria.

Tum Tum se aproxima com uma bandeja e nela consigo ver uma pequena quantidade de massa de cor cinza misturada com vermelho. Sam pega um pouco da massa com uma colher e tenta colocar na minha boca. Reluto. Levo outro soco. Sam força a massa muito gosmenta na minha boca. No começo o gosto é amargo, mas depois de uns segundos fica doce. E gostoso. Na verdade, gostoso até demais.

- Hmmmmm.... Não é tão ruim. O que é isso?

- Segredo. Quer mais um pouco?

- Sim.

Sam coloca mais um pouco na minha boca e como criança eu vou comendo tudo. Lambendo até os beiços. Olho para a bandeja e vejo que acabou a tal massa gosmenta. Fico triste. Nunca havia comido algo tão diferente e tão saboroso. Pergunto então se há mais daquela massa.

- O doutor quer mais, então?

- Quero. É muito gostoso isso.

- Ok. Vou preparar mais um pouco. Só um segundo. Já volto.

Sam sai e quando volta trás com ele um espelho grande que temos no laboratório.

- Para que esse espelho.

- Você não quer saber o que é está comendo?

- Sim.

- Pois bem. Tum Tum, please.

Tum Tum pega o espelho e coloca na minha frente. É quando eu tenho noção real do que está acontecendo. Estou totalmente amarrado e sobre minha cabeça está Sam. E com ele o bisturi. Ele então gentilmente começa a mexer o topo da minha cabeça e retira o meu coro cabeludo, deixando exposto o meu cérebro.

- OH MEU DEUS. O QUE É ISSO? OH MEU DEUS !!!

- Isso, DOUTOR, é o seu cérebro.

- O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO?

- Ora. Preparando o jantar.

Sam, então, pega o bisturi e enfia no meu cérebro. O sangue escorre por minha testa. Ele tira um pedaço e dá para Tum Tum que ligeiramente põe na boca e lambendo os beiços diz:

- Hmmmm... quase tão bom quanto banana.

Fico alucinado. Quero fugir mas não consigo.

- EU VOU TE MATAR SAM. EU VOU...

- Vai me matar como matou meus amigos???

Sam corta mais um pedaço do meu cérebro e então perco a fala. Grito loucamente, mas não sai um som sequer. Pelo espelho, vejo os dois se alimentando do meu CÉREBRO.

- Hmmmm... que delícia, doutor. Depois do cérebro acho que vou pegar um pedaço do nariz. E depois uma orelha. E depois de acabar com a sua cabeça, a gente vai para os braços, o peito. Hmmmm... Pensando melhor, deixa eu pegar agora um pedaço da orelha. Parece apetitosa.

- NÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃÃOOO !!!!





Esse relato, caro amigo leitor, não aconteceu. Pode ficar sossegado. Eu estou bem. E inteiro. O que escrevi foi um sonho que tive e que me fez acordar sem fôlego e com o coração disparado. Eu tive o que os cientistas chamam de paralisia do sono. Eu acordei e por alguns segundos não consegui me mexer. Lembro que tentei gritar, mas não saiu um som sequer. Fiquei apavorado. Foi uma sensação horrível e espero não vivenciá-la novamente.


Espero de coração que você nunca passe por isso. Mas preciso alertá-lo: estudos mostram que a maioria das pessoas irá, em algum momento da vida, passar por essa terrível experiência. Se você já passou, sabe do que estou falando. Se você ainda não, prepare-se. O negócio é feio.