Santinha |
Ela que
sabe.
Não sei
vocês, mas cresci pensando que minha mãe era a pessoa mais esperta do universo.
E olha que ela só teve a oportunidade de estudar até a quarta série do primeiro
grau. Ela teve que trabalhar logo cedo, como milhares de crianças desse nosso
Brasilzão.
Desde
pequeno temos nossas curiosidades. Por que isso? Por que aquilo? Por que posso
isso e não posso aquilo? Por que meu irmão pode e eu não posso? Por que tenho
que ir para o quarto quando começa esse programa na televisão? Por que colocam
a mão nos meus olhos quando duas pessoas encostam a boca uma na outra?
Crescemos com essas questões mais do que filosóficas a nos cercar e perturbar
nossas pequenas mentes.
Lembro
que quando uma dessas questões rodeava meus pensamentos eu recorria à ele, o
cabeça da casa, àquele que ostentava a
honra de segurar o controle remoto: meu pai, o seu Barriga. Lembro dele olhando
para mim com aquele ar sério. E depois de pensar muito dizia: Pergunta pra sua mãe. Ela que sabe.
Lembro
como se fosse ontem:
- Pai, posso ir para casa do Marcelo? A
gente vai jogar vídeo-game.
- Não sei. Pergunta pra sua mãe. Ela que
sabe.
- Pai, posso por essa calça nova para ir
para escola?
- Não sei. Pergunta pra sua mãe. Ela que
sabe.
- Pai, posso voltar depois das onze?
- Não sei. Pergunta pra sua mãe. Ela que
sabe.
Penso
até que o comercial de um famoso posto de gasolina foi inspirado na minha mãe,
pois tudo que queremos saber ou comprar é só perguntar pro pessoal que trabalha
nesse tal posto.
Quero
deixar claro que não estou dizendo que meu pai sabia de nada. Algumas perguntas
ele respondia. E com muita clareza.
- Pai. Posso ir ao cinema com meus amigos?
- O que sua mãe disse?
- Não.
- Então não.
Havia
momentos que ele era firme na resposta.
- Pai, posso ir para praia com meus amigos?
- Já perguntou pra sua mãe?
- Ainda não.
- Então fala com ela primeiro. Ela que
sabe.
Isso me
deixava cada vez mais apaixonado por aquela mulher simples da roça da Bahia,
mas que sabia de tudo. Ficava imaginando porque ela não fazia parte do governo
brasileiro. Ela com certeza seria uma cientista fenomenal. Poderia até
participar de um grupo seleto naquela tal agência espacial... não recordo o
nome agora... ah sim... NASA.
Ficava
imaginando minha mãe à frente de um resgate inter-planetário, todos nervosos,
apreensivos, sem saber o que fazer, até que alguém perguntaria para o
presidente da nação mais poderosa do mundo: - Senhor, presidente. O que faremos
agora? E ele diria sem pestanejar: - Pergunta
pra ela. Ela que sabe.
Me impressionava
também a precisão com que previa a hora exata que eu iria cair. Lembro como se
fosse ontem. Estava descontraidamente correndo pela casa e nada, absolutamente
nada havia acontecido. Corria livremente fingindo ser um super herói. Minha mãe estava
na sala, compenetrada em seus afazeres domésticos quando, sem mesmo olhar para
mim, ela dizia as palavras proféticas:
- Menino, pare de correr pela casa. Você
vai cair já já.
Dito e
feito. Era queda na certa. E aos prantos, com o joelho esfolado, eu me
aproximava, implorando por carinho e compreensão. Ela, com toda sua sabedoria,
continuava com seus afazeres e então soltava:
- Eu te disse, não te disse? Eu avisei.
Então,
depois de entender que eu havia aprendido a lição, e depois de muito choro, ela
vinha ao meu socorro. Me acariciava, me abraçava, me beijava e, o mais legal,
soprava meu machucado. Se esse sopro ajudava na cicatrização do machucado é
algo que nunca saberei, mas que aquele gesto me acalmava, ah me acalmava.
Não havia limite para seus conhecimentos:
- Tá com dor de estomago? Chá de boldo.
- Passou muito tempo debaixo do sol? Banho de ovo.
Passado um tempo percebi que esse talento, essa sabedoria, esse dom não era algo apenas da minha mãe, mas de todas as mães. Senão todas, da maioria. Fiquei imaginando o porque disso e cheguei a conclusão de que não há explicação. O que elas sabem não se aprende e sim se herda. Se passa de geração para geração.
Antes da minha mãe teve a minha avó. E antes da minha avó teve a mãe da minha avó, também conhecida como minha bisavó. E antes da minha bisavó teve a mãe dela. E assim por diante.
Essa sabedoria também é conhecida por instinto maternal. Aquele que procura prever o que é melhor para sua prole. Pode ser que em alguns momentos ela erre. Serão momentos raros, mas acontecerão. Afinal de contas, ninguém é perfeito. Nem mesmo nossas mães. Mas se elas não são perfeitas, são quase.
Minha mãe foi perfeita dentro da sua imperfeição. Acertou em quase todas as previsões, mas errou em uma: não previu o dia que iria partir. Nos deixou bem antes do que imaginávamos. Mas partiu no momento certo de Deus.
Mães são assim. Elas vêm e vão. Nos enchem de carinho e amor. Nos preparam para as batalhas da vida. Se necessário morrem por nós. E quando finalmente entendemos isso, elas partem. Tristes, talvez, pela separação. Mas felizes por terem feito o melhor, apesar de muitas vezes acharem que falharam.
Parabéns à todas as mães do Brasil. Em especial para Almerinda, Simone, Lucélia, Dora, Lika, Elis, Nice, Marta, Cleide, Dani, Patricia, Kelly Cristina e Kelly.
FELIZ DIA DAS MÃES
HAPPY MOTHER'S DAY